quarta-feira, 19 de junho de 2019

"Democracia em Vertigem" e a guerra cultural - por Igor Guedes

O documentário "Democracia em vertigem" de Petra Costa, cineasta mineira de 35 anos, estreou nesta quarta, 19, buscando construir uma narrativa acerca dos últimos acontecimentos políticos do Brasil. 

Neta dos fundadores de uma das maiores construtoras do país: a Andrade Gutierrez, e filha de dois ativistas políticos de esquerda dos anos 70, a diretora narra os fatos a partir da perspectiva de uma militante desiludida com a derrota democrática.

O documentário utilizou-se fartamente de recursos audiovisuais para endossar sua narrativa e conduzir o telespectador por uma suposta decadência do processo democrático brasileiro. Nas entrevistas de rua, o foco das filmagens eram sempre as figuras mais caricatas, tomadas sob uma perspectiva maniqueísta.  

De um lado, saltam aos olhos o homem branco, de meia idade, vestindo a camisa da seleção brasileira, pedindo o fim da democracia, clamando pela volta dos militares e destilando preconceitos. Desaparecem os cartazes contra a corrupção, daqueles que pediram o equilíbrio das contas fiscais, dos que questionaram o financiamento dos portos e obras faraônicas em países governados por ditaduras africanas e latino-americanas. Desaparecem os bilhões devolvidos aos cofres públicos pela Lava Jato e o ineditismo que contraria o cerne do discurso da esquerda: não eram apenas pobres e pretos sendo presos pela polícia, finalmente, assistíamos empresários e políticos pagando por seus crimes. 

Por outro lado, nas manifestações pró-PT, emergem as lágrimas e a emoção genuína. O foco são os manifestantes que enxergam em Lula um redentor, uma figura paterna, amável e imaculada de bondade e ternura. Há uma, em particular, de dois pipoqueiros fugindo do gás lacrimogêneo: o ranger da roda do carrinho de pipoca, a expressão simples e sofrida são comoventes e atendem ao interesse da construção narrativa. 

A imagem que emerge é do negro, pobre, desiludido com o jogo sujo da estrutura de poder que afastou, injustamente, uma presidente honesta e prendeu um homem de bem. Desaparecem as vultosas somas de dinheiro desviadas pelo PT e aliados. O "golpe" parece ter sido movido por uma elite branca amargurada pela ascensão do mais pobre.

Propondo-se analisar a fragilidade da democracia brasileira, o documentário esquece de contemplar o maior atentado contra o processo democrático de 2018, a tentativa de assassinato de Jair Bolsonaro, arquitetado por um militante de esquerda na véspera das eleições.

Ao final, a esquadrilha da fumaça corta os céus da Esplanada dos Ministérios enquanto Michel Temer passa a faixa presidencial para Jair Bolsonaro, sob uma trilha sonora carregadamente sombria e melancólica. Caso fosse filmada em preto e branco, lembraria a ascensão do partido Nazista enquanto a Luftwaffe sobrevoa os céus de Berlim. Em contraste com a imagem de pessoas humildes em lágrimas e pipoqueiros fugindo de gás lacrimogêneo, a esquadrilha parece prestes a pulverizar as periferias do país com gás Zyklon B, atendendo aos anseios do "governo fascista recém eleito e da elite branca e preconceituosa que o conduziu ao poder". 

O fato, entretanto, é que assistimos, nas duas últimas décadas, um processo eleitoral regular, legítimo, ininterrupto e que ocorreu sob a supervisão de instituições democráticas sólidas, fiscalizadas por uma imprensa livre e sob o olhar atento de uma população profundamente dividida. Foi, aliás, a solidez desse sistema que permitiu que presidentes ideologicamente opostos, tomassem posse e se sucedessem no palácio do planalto sem rupturas do tecido social.

Sendo assim, o título grandiloquente: "Democracia em Vertigem" confunde democracia com partidarismo. Petra Costa interpreta a quebra do discurso hegemônico da esquerda como um risco para a democracia.

O processo democrático segue intacto, o orgulho da esquerda é que está trincado.



terça-feira, 18 de junho de 2019

Celebração dos 111 anos de imigração japonesa no Brasil

O primeiro navio: Kasato Maru

Nesta Terça-Feira, dia 18 de Junho, comemoramos os 111 anos da imigração japonesa no Brasil. A escolha do dia relembra a chegada do primeiro navio, Kasato Maru, com 165 famílias embarcadas em Kobe, Osaka, com destino ao porto de Santos. 

A epopéia de 52 dias em alto mar foi apenas um dos obstáculos vencidos pela virtuosa imigração japonesa que, muito antes de desembarcar em nossos portos, encontrava forte resistência de eugenistas brasileiros. 

Em 13 de Maio de 1888, pelas mãos da redentora Princesa Isabel de Órleans e Bragança, a escravidão chegava ao fim no Brasil. Desde então, nosso país recebeu grandes levas de imigrantes europeus que substituíram, aos poucos, a mão de obra escrava. A maior parte era composta de italianos, mais de 1 milhão destes imigrantes desembarcaram nos portos brasileiros nas duas últimas décadas do século XIX. Entretanto, devido ao tratamento rude administrado por parte dos produtores de café do oeste paulista ao italiano, o fluxo reduziu-se drasticamente, sobretudo após a assinatura do decreto Prinetti em 1902.

Este cenário abriu, pelo menos economicamente, espaço para o imigrante nipônico que ainda precisava vencer a resistência do pensamento eugenista em vigor na época. Até 1890 a entrada de asiáticos e africanos era proibida por decreto assinado pelo presidente Deodoro da Fonseca e endossado por seu Ministro da Agricultura Francisco Glicério. 

Ryu Mizuno capitaneou a imigração japonesa ao Brasil

Apesar da resistência de parte da opinião pública, o empreendedorismo e aptidão ao trabalho do japonês logrou sucesso na lavoura cafeeira e na produção hortigranjeira, sobretudo na de chá, morangos, seda e algodão no interior dos estados do Paraná e São Paulo.

O fluxo de japoneses foi incrementado com a proibição desta imigração nos EUA, Canadá e Austrália. O Brasil, apesar de limitar, não proibiu a entrada de japoneses, tornando-se ao longo das décadas de 1920 e 1930, a maior comunidade japonesa fora do Japão em todo mundo.

Família de imigrantes japoneses

Atualmente, a comunidade de nipo-descendentes no Brasil chega a quase 2 milhões de habitantes (1,09% da população). Sua presença transformou a agricultura com a introdução de novas técnicas como a hidroponia, além de espécies ainda desconhecidas no país como a mexerica poncã, o caqui, e a maçã fuji. A introdução dessas culturas foi um ponto de inflexão na agricultura do Brasil que passou de importador de maçãs argentinas para exportador dessa fruta. O mesmo aconteceu com o melão, que antes importávamos do Chile e da Espanha. 

A tendência do japonês ao comportamento cooperativista também transformou a produção de carne de aves e ovos no interior de São Paulo. A cidade de Bastos (SP) tornou-se a maior produtora de ovos da América Latina através do empreendedorismo dos nikkeis.

Os avicultores Wagner e Eduardo Mizohata

É importante salientar que o bairro da Liberdade na cidade de São Paulo expressa características da rica cultura japonesa no ambiente urbano, através de seus pórticos vermelhos e dos restaurantes de comida típica. Vale a pena a visita ao Museu Histórico da Imigração Japonesa na rua São Joaquim, número 381, bairro da Liberdade, aberto de terça a domingo no período da tarde. Outro passeio imperdível é o Pavilhão Japonês no Parque Ibirapuera. 

Onde quer que o imigrante japonês tenha pisado, promoveu o incremento e expansão da economia local, além de enriquecer, sob muitos aspectos, a caleidoscópica e multifacetada cultura brasileira. 

Deixo aqui meu agradecimento aos 111 anos da profícua e virtuosa imigração japonesa no Brasil, especialmente aos paraenses descendentes de Mitsuyo Maeda, pai do Jiu-Jitsu brasileiro e Lyoto Machida, um dos maiores campeões brasileiros do UFC.