quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Religião e o declínio da magia


Religião, astrologia e magia ajudam o homem a enfrentar momentos difíceis, ensinando-o a evitar as desgraças ou, pelo menos, dando uma explicação para elas. Numa época de muita pobreza, muitas doenças, medicina precária e desgraças súbitas - como a Inglaterra dos séculos XVI e XVII - essas crenças desempenhavam um papel essencial na sociedade como fonte de alívio material e meio de explicar infortúnios de outra forma incompreensíveis. Neste livro erudito e fascinante, Keith Thomas examina minuciosamente a função de astrólogos, curandeiros, adivinhos, bruxos, profetas e o sistema de crenças relacionadas que permeavam toda a sociedade inglesa, embora tivesse presença mais marcante entre as classes populares.

Nesse terreno controverso e, com freqüência, pantanoso, o autor constrói uma obra de rigor exemplar, que desfaz mitos, põe por terra interpretações que pareciam corretas, desentranha relações complexas e vai fundo em cada aspecto estudado, sempre fundamentado em uma documentação impressionante e fazendo uso de interpretações esclarecedoras, como as da antropologia contemporânea. Ao mesmo tempo, traz à vida personagens cativantes, algumas obscuras, cujas histórias estavam perdidas em arquivos judiciais, e outras de astrólogos famosos, que chegaram a alcançar notoriedade e deixaram seus livros de casos para a posteridade.

O objetivo primordial de Thomas é compreender alguns sistemas de crenças que, normais na Inglaterra dos séculos XVI e XVII, já não gozam do mesmo significado em nossa época. Enseja-nos, desse modo,uma prazerosa viagem através de temáticas tão fecundas quanto a religiosidade popular, a magia na igreja medieval, o impacto da reforma protestante, a prece e a profecia, a Cura mágica, o curandeirismo, assim como a astrologia. Percorre formas clássicas de apelo ao passado, tais como as antigas profecias, ou ainda crenças como fantasmas e duendes. Seu eixo é, em alguns momentos, a forma especifica da bruxaria na Inglaterra, associada à história da criminalidade, de modo a dar conta dos mecanismos sociais de produção da bruxa, bem como de seu declínio. A parte final e a conclusão detém-se, como o próprio título sugere,em caracterizações das razões do declínio da magia.


Algumas das crenças aqui descritas parecem-nos completamente estranhas: acreditava-se, por exemplo, que um toque de mão do rei curava doenças, ou que uma pomada aplicada numa arma ajudava a sarar o ferimento que ela provocara. Outras nos são mais familiares, pois extravasam do local e da época para continuarem presentes de alguma forma no mundo de hoje. O próprio autor nos adverte que, embora a importância da magia tenha declinado no final do século XVII, ela não desapareceu, nem vai desaparecer: "Se a magia for definida como o emprego de técnicas ineficazes para mitigar a ansiedade quando as eficazes não estão disponíveis, então devemos reconhecer que nenhuma sociedade jamais estará livre dela".


Um comentário:

  1. O livro foi publicado em português, pela Companhia das Letras. Mas está esgotado na editora, e exemplares no mercado de usados são vendidos por um alto preço.

    Fotos das capas:
    https://images-na.ssl-images-amazon.com/images/I/91CNDECvXfL.jpg
    https://images-na.ssl-images-amazon.com/images/I/91hdPGapBAL.jpg

    ResponderExcluir